Ir
assistir às sessões fotográficas, ver como mudam de roupa, colocam adereços e
se expõem a uma objectiva máquina fotográfica, permite ver o melhor e o pior
das pessoas, ainda antes de lhes fazer a primeira pergunta. Tento sempre ser
invisível nesse objectivo. Mesmo que fale, ou diga piadas, quero ver como
brilham os olhos e as palavras dos entrevistados que ainda estão para ser. Travestido
com a minha personagem hipster entrevistador nas horas vagas, percebi
rapidamente que o Délio é um líder. Um líder de ideias e de estilos, alguém que
fotografa como se vê ao espelho: uma mistura de vários mundos e de várias
épocas. Para os que sabem como se faz, foi só mais um dia para a Marta e para o
Herberto no estúdio da DIF.
Mas quem é este
tipo?
O
Délio nasceu em Luanda e tem 33 anos. Veio para Portugal com 18 anos para
trabalhar com um primo numa serigrafia. Para fazer a sua vida continuar nesta
direcção geográfica, viu a sua família espalhar-se pela Europa e por África.
Não teve medo e manteve a sua curiosidade sempre activa, a abrir aparelhos
electrónicos, a colecionar fotografias e documentos, até ao ponto em que
começou a mostrar as suas “brincadeiras” ao mundo. Nunca estragou uma única
fotografia original, mas os processos que usa ofereceram ao mundo pequenas
máquinas do tempo, entre o que cada história pessoal já foi e aquilo que ainda
pode ser hoje. Parece pouco, mas já o levou em pouco tempo, a ser finalista no
BESphoto.
Pergunta da artista
Helena Canhoto
A minha
última entrevistada deixou-me uma pergunta, sem saber que calharia a um
fotógrafo angolano como o Délio. Mas ele não recusou a resposta pronta. O que é que falta ao cinema português? “Falta
um grande Kick! Mas tem também a ver com dinheiro, como se vê os cinemas vão
todos abaixo, porque não há ninguém. Além do Manuel de Oliveira, e do João
César Monteiro, de quem eu gostava muito, que era uma figura que parecia mais
um performer do que um cineasta. Mas há muito pouco cinema bom feito em
Portugal, há documentários bons, há coisas engraçadas, mas neste passado
recente não há nada que me entusiasme.” E
o cinema angolano? Foste ver a rainha Njinga? “Não, ainda não. O cinema
angolano, tem poucos cineastas. Como o Kiluanje Liberdade que tem feito coisas
interessantes fora daquela coisa do Kuduro, que retrata o que se está a passar
na Angola de hoje. E temos o Zezé Gamboa que tem feito um grande trabalho em
prol do cinema em Angola. Mas lá como cá, foca-se tudo em telenovelas.” Mas então achas que se segue a referência
portuguesa? “Sim, são heranças históricas de onde vamos beber, mas o Brasil
tem feito muito mais produção, são muito fortes. Já Portugal, está muito parado
em relação a Itália ou Espanha.”
O angolano
A
falar de comparações, não resisti a perguntar quais eram os pontos de vista
angolanos sobre Portugal. Tens ideia de
como é que um angolano vê Portugal? “É o quintal de Angola! É quase uma
brincadeira entre amigos, porque qualquer coisa que se precise tratar, como
abrir uma conta, fazer compras ou investir. Nós vamos sempre para um país
vizinho em que se fale a mesma língua, e para um angolano é sempre Portugal. É
o quintal porque vais a um restaurante na Baixa e lá estão os angolanos de
classe alta, por isso brincamos a dizer que é o quintal de Angola, porque eles
estão sempre cá.” Mas ainda te lembras
do tempo em que a referência angolana era Cuba ou a URSS? “Lembro-me, nos
anos 80. Desde os carros até o meu pai a falar “cubano” com um vizinho.
Vizinhos meus que eram militares, com cargos importantes, recebiam cubanos em
casa. E amigos que tinham raízes cubanas. Com os soviéticos, lembro-me de pouca
coisa, a não ser das armas.” Mas era
mesmo para Portugal que querias vir? “Era para aqui sim, porque já desde
miúdo que falávamos de eu ir para Portugal, para além disso tinha um bisavô
português. Daqueles que foram entalados e tiveram de casar e ficar por lá, a
família da minha avó agarrou-o, ele casou e registou os filhos.” E qual era a ideia que tinhas disto antes
de vires para cá? “A ideia era feita através da televisão da altura e de
alguma informação dos meus pais, e dos meus avós que tinham cá casa em Benfica
desde os anos 70. A primeira viagem dos meus pais, no final dos anos 80, foi
para Portugal. Como somos uma família numerosa, três irmãos e duas irmãs, os
mais novos vieram antes, para estudar e por questões militares e de insegurança
daquele período em Angola.” Consegues
imaginar como serias se, nessa altura, tivesses lá ficado? “Estaria a
trabalhar no porto de Luanda, como ajudante de despachante, tive vários amigos
que foi para ai que foram. O meu avó tem um escritório de despachante, o meu
pai também sempre foi despachante, agora cada vez há mais mercadoria e seria
isso, tratar das matrículas dos carros, dos modelos dos carros. Desde miúdo que
ouvia isso do chefe de departamento, um colega do meu pai gozava comigo e com o
meu irmão e chamava-nos isso. E os modelos e chapas de chassi, sempre me atraíram.
Eu sempre fui um miúdo curioso e ligado à desmontagem das coisas, ao perceber e
ao ver a parte mecânica, e se calhar teria ido por ai. Mas é mau quando alguém
nos diz que tens de estudar medicina ou
fazer isto ou aquilo. A seguir ao 12º ano, tens de decidir o que é que queres
fazer realmente, e nem todos têm de ser engenheiros. O que é que seria de uma
sociedade sem um sapateiro, marceneiro ou padeiro?” E já terias filhos? “Claro, ali é muito rápido. Enquanto que na
Europa se pensa muito em ter um filho, em Angola pensasse em ter quatro, cinco
ou três. A minha irmã que ficou por lá tem 30 anos e tem 3 filhos, eu que estou
aqui tenho 33 e não tenho nenhum.” Mas a
tua família foi para vários destinos. Porquê? “ Por razões de mau estado
económico do país. No final dos anos 90 as coisas estavam muito complicadas,
tivemos grandes momentos bons e históricos em Angola, mas depois houve um
período em que as coisas começaram a apertar. Um tio meu, que estava ligado ao
governo, ajudou o meu irmão Danilo a ir para um cargo na embaixada em Itália, e
eu e o meu outro irmão mais velho, que estávamos a chegar à idade militar,
viemos para Portugal. Ainda fiz o recenseamento militar mas não fui à tropa,
podia correr bem, mas também podia correr mal.” E o teu nome Délio, de onde vem? “Os meus pais sempre foram
criativos com os nomes, o meu irmão mais velho é o Mudassir, que é um nome
árabe, a seguir eu, que sou o Délio, um nome grego, depois o Danilo, um nome
hebraico, depois a Irina, nome russo, e depois a Daia, que é um mix de Diana
Ross, porque ela é Daia Rosélia. Acho que a minha mãe tinha uma panca por essa
cantora…” E o Jasse? “O meu bisavô
era moçambicano, preso político em Angola. Na altura mandavam os presos
políticos para países diferentes, mas não sei bem explicar essa parte, porque
as histórias contadas pelos avós são sempre só contadas de boca em boca e nunca
dizem tudo, porque quem conta um conto acrescenta um ponto. Ouvi várias coisas
mas o Jasse era de Inhambane, em Moçambique, e era um enfermeiro que ficou com um
grande nome em Angola.”
O colecionador
Reparei
que o Délio coleciona coisas, entre documentos, cartas, aerogramas e até
relógios, ele é quase um arquivista do tempo a precisar rapidamente de uma casa
museu para lá guardar todo este espólio. Lembras-te
de quando começaste a colecionar coisas? “Eu nunca fui um colecionador de
cromos ou de carrinhos de brincar, eu gostava mesmo era de desmontar as coisas,
tirar os dínamos e fazer barcos. Descobrir como é que íman funciona, ver como é
que é o interior das coisas. Mas onde me bate a cena do colecionar é já cá em
Portugal, porque desde a infância que cresci a ver registos e documentos do avô
e da família, e eu era muito ligado ao álbum de família e quando vim para cá,
vim só com duas ou três fotografias da família, porque os meus pais e as minhas
irmãs foram para a Holanda, e para passar o tempo e ver a família, só tinha as
fotos.” E vocês ainda se conseguem
juntar todos?” Há anos que não nos juntamos, falta sempre alguém, o natal é
cá ou em Angola, mas ainda nos estamos todos a tentar juntar. Adoro esse
momento e é o melhor momento para nós, onde comemos a herança portuguesa do
bacalhau cozido com grão. Mas a parte da colecção, que já me estava a distrair,
vem das fotos de família, do álbum que eu tinha sempre. E quando chegava a
casa, naqueles dias especiais como o aniversário de alguém, batia e eu ficava a
olhar para como era a Irina há uns anos… E vem daí a vontade de colecionar.
Comecei por colecionar máquinas fotográficas antigas, polaroids e isso. Depois
comecei a comprar fotos de desconhecidos, para ver como se fotografava na
altura, a qualidade da imagem… hoje há muita fotografia no mercado, na altura a
fotografia era muito bem feita, serrilhada à volta, muito bem tirada, ao pé do
avião, ao pé de uma ovelha de não era da pessoa… aquilo era lindo! E eu começo
a colecionar cada vez mais.”
O serigrafista
O
Délio chegou a Portugal para trabalhar na Serigrafia de um primo, Aladino
Jasse, que estava por cá desde os anos 70. Mas
o que é isso da serigrafia? “A serigrafia é um processo mecânico em que uma
imagem é impressa com tinta, e a fotografia passa pela serigrafia. Dentro do
atelier havia um quarto escuro para revelar fotos, para se fazer os fotolitos
para a serigrafia, e é aí que começa esse bichinho pelas artes visuais. O que
me fascinava era o processo de impressão da imagem, em que após um banho com um
líquido a imagem aparecia num papel branco, como no filme Blowup do Antonioni. Depois de um banho de revelação começa o
fantasma a aparecer, esse foi o maior fascínio pela fotografia. Porque eu comecei
a fotografar sem máquina. Eu não tinha uma máquina fotográfica, pegava numa box (caixa de sapatos com um furo) onde
entrava o papel directamente e abria ao sol. Fazia isso por gozo.” E quem reparou nisso que estavas a fazer?
“Foi no segundo atelier de serigrafia, em que trabalhei, que também tinha um
laboratório, máquinas fotográficas, livros, era uma biblioteca e foi a minha
grande escola, esses dois ateliers, não foi numa escola ou universidade. Se
tivesse numa universidade seria mais um, não sei o que seria, podia ser uma
coisa boa também mas não me arrependo por essa opção. Porque na altura o meu
chefe, que foi um guia para mim, é que me cativou, que via o que eu fazia em
casa, sem saber com que métodos, mas que via o que eu trazia de quinze em
quinze dias e me motivava. Hás vezes com imagens praticamente todas negras, mas
sempre com elogios e palavras de incentivo, tipo isto está óptimo mas tens que
dar aqui um bocado de contraste aqui ou ali, mas está óptimo, estás melhor.” Foi ai que te sentiste artista? “Eu
sempre gostei de fazer coisas diferentes, de mexer com coisas, criar coisas.
Mas eu, até agora, acho que não me sinto artista, sou um criador. Artistas há
vários, cada um na sua área, mas gosto dessa parte da criação e de ser um
criador, um fotógrafo mas criador.” É aí
que fazes a tua primeira exposição? “Sim, a primeira exposição que faço,
que hoje não ponho no currículo, foi na Livraria
Italiana da Rua do Salitre. Já tinha algumas opções, poucas, mas tinha
algumas. Num restaurante ou café não, pessoal a fumar no meio das fotografias,
não me apetecia, e este espaço foi óptimo. Uma livraria, fantástico! Havia
livros, um White Cube, fazia sentido
naquele sítio. O trabalho que eu tinha mais honesto na altura, bem feito e bem
mixado, era mais plástico do que agora. Estamos a falar de fotografia com
borrões de tinta por cima, não era um Arnulf Rainer mas era um Délio Jasse que
nem conhecia o Arnulf Rainer na altura mas já estava a fazer Arnulf Rainer. A
exposição era individual, com 18 peças emolduradas, e chamava-se
Sombra/Reflexos.”
O fotógrafo
Recentemente
o Délio foi reconhecido através do BESphoto, em que foi um dos três finalistas
deste ano. Continuas a ser o mesmo miúdo
que gosta de experimentar coisas? “Até agora não parei, continuo a
experimentar, todos os dias experimento. Não digo que estou prestes a fazer do
quadrado redondo, mas tento fazer a fórmula triangular a partir desse quadrado.
Todos os dias eu tento lapidar um canto desse quadrado e estar sempre a
improvisar e a ver outras formas do quadrado, mas sempre que entro no
laboratório, estou a experimentar. Esse trabalho do BESphoto, que me deu mais
visibilidade, foi um trabalho que ao ser projectado e maquetizado, deu origem a
cinco projectos diferentes. Expus um, guardei três e outro deles já apresentei,
porque eu estou sempre a experimentar.” E
agora, para onde vais? “Esse trabalho do BESphoto vai para São Paulo no
Brasil, e fica num prédio lindíssimo do Instituto Tomie Ohtake. Tenho também
uma exposição, em novembro, para uma galeria na Cidade do Cabo. E uma
residência artística/exposição para a Alemanha.” E consegues viver da fotografia? “Cá consigo, em Angola já não, que
é tudo mais caro e complicado. Mas quando melhorar quero passar temporadas lá e
outras aqui. Um dia, gostava, mas não digo agora, por várias razões.” Mas sentes que estás a ser reconhecido em
Angola? “Eu estou a fazer a minha parte. Sim, sinto isso. O adido cultural
da embaixada apareceu na exposição e deu-me bastante força, amigos e pedidos de
amizade vindos de Angola, também aumentaram. Reconhecem-me da televisão e falam
comigo na rua também.”
O empate
O
Délio está quase há tanto tempo em Portugal quanto esteve em Angola,
aparentemente haverá um empate técnico de tempo. Tu sentes-te mais angolano ou português? “Eu sou sempre angolano,
se bem que gosto de beber de outras culturas, beber de várias águas. Não me vou
isolar, se for a Londres ou aos Estados Unidos, eu não vou estar no bairro dos
angolanos. Eu saio bastante dos sítios, até de mim hás vezes, não vou de
encontro a coisas com que não me identifico. Tenho uma visão universal, não
local, tento sair disso.”
O arqueólogo
Tantos
documentos arquivados, como passaportes, cartas de aviso de morte, aerogramas,
farão do Délio um arqueólogo descobridor de histórias pessoais fósseis, ou até
um arquivista de emoções. Sentes essa
responsabilidade? “Sinto. O caso da identidade, de onde é que nós viemos,
das colónias. Fomos colonizados, e isso é apagado da identidade, é uma
identidade que se vai apagando. Há camadas eu mexo com isso, à procura de
desvendar alguma coisa, ou de mostrar alguma coisa. Ninguém se recorda, há
pessoas que não sabem que existiu, que existe ou que já existiu. Os aerogramas,
por exemplo, eram enviados pelas madrinhas de guerra, que podiam ser homens ou
mulheres. Alguns têm até uma escrita diferente que eu não consigo decifrar, mas
há muitos enviados para cativar o pessoal que estava lá na guerra, uma cena de
carinho que mexia com os soldados.” E o
que é que vais fazer a todo esse arquivo? “Ainda não pensei nisso, mas eu
não mexo com os originais, estão todos intactos. São fotografados e re-fotografados,
scanners, limpos e quase esculpidos para um dia apresentar não sei onde, mas
guardo tudo. Os meus documentos da segurança social ou do IRS, não lhes dou
importância, mas o resto guardo tudo. É como aquelas coisas dos arquivos mortos
em que tens de guardar durante 5 anos ou isso, e isto para mim é um arquivo
vivo, porque conta uma história. Uma certidão, uma fotografia tipo passe, um
cartão antigo do metro, tem mais história e valor. Um documento com uma
assinatura, um cheque que tem coisas escritas no verso, têm códigos e
fronteiras. Uma fatura da farmácia com palavras a vermelho e tracejados a
preto, para mim é interessante.” O que
muda tudo é um sinal pessoal? “É a assinatura por baixo, um carimbo, isso
para mim é um documento, é uma fotografia, e não uma mera fatura, é uma imagem
que revela um momento.”
As máquinas do
tempo
O
homem coleccicona, máquinas de todo o género, ao ponto de eu achar que ele
está, secretamente, a construir uma máquina do tempo. Avisado o Délio, de que
não poderia desmanchar esta máquina do tempo, analogia mecânica de outras
coisas, propus-lhe uma pergunta provocatória: Se existisse uma máquina do tempo, gostarias de viver numa época
diferente? “Não. Quem sabe as coisas corriam mal… até agora têm corrido bem
e eu acho que se recuasse a um outro tempo, podia correr mal o percurso. Esta
linha, que é tipo um gráfico, tem corrido bem, noutra podia perder uma perna na
tropa e ia para a guerra. Se ficasse só nas coisas positivas… gostava de voltar
aos anos 60 em Angola. Na altura do Urbano de Castro e do David Zé, daquelas
músicas, aquelas vestes, as imagens. É desse período que eu gosto, não estou a
falar das colónias e isso, isso não me interessa, aconteceu e tomara que não
volte. Há imagens lindas do meu avô com bons momentos, mas em Angola. Eu gosto
de Angola, gosto do meu país.
Luanda
Durante
12 anos não voltou a ver Luanda, tinha de lhe perguntar: O que é que tinha mudado? “Mudou muita coisa. Na arquitectura,
principalmente, olhas para uma casita e pensas: isto foi feito pelo colono, mas
quem é o colono? Em miúdo ouvia isso e não percebia bem o que era. Há uma
ligação a Portugal que ficou, em África só há duas praças de touros, uma em
Moçambique e outra em Angola. Essa influência ficou, o mercado do peixe. Só não
me consigo identificar com aquelas estruturas de prédios grandes na baía, se
fosse fora de Luanda… mas ali é demais e não há espaço.” E as pessoas? “Também estão diferentes e só pensam em fazer
dinheiro, não pensam em dar, pensam em tirar e ter, todos querem ter. Vivem de business, porque é uma cidade cara e que
cresceu muito mesmo, então as pessoas vivem de biscates.” E se eu for a Luanda, onde é que achas que devo ir? “A ilha do
Mussulo, que tem que ser já porque daqui a bocado está cheia de pedra e betão.
Cabo Ledo, que tem grandes ondas para fazer surf ou só para olhar e sentir o
mar, e onde também podes comer um bom peixe. Como ao fim de semana não há nada
para fazer e só há um cinema, o domingo é fazer praia. Sábado é copos, domingo
é praia para curar a ressaca e comer um caldo de peixe, Muzomgé como eles dizem
em kinbundu. O domingo é o dia da depressão em Angola.”
Quando te cruzas
com um angolano na rua, sabes logo que é angolano?
“Sim.
Pela maneira de estar, que só um angolano é que consegue reparar, antes de
abrir a boca, que ai temos a gíria e é mais fácil, mas temos o nosso ar e a
nossa mania curtidora. Há ali uma ginga que é muito angolana, difícil de
explicar mas que está lá, pela maneira de vestir, porque somos muito vaidosos
mesmo. É o orgulho, há uma música do Paulo Flores, que é O Orgulho de Ser Angolano…”
Associações
emocionais
Para
brincar lançou-se uma ou duas palavras escolhidas pelo Pedro, e esperou-se uma
reacção do Délio.
Ruínas – “Construção/ruína,
construção/ruína. É aquela coisa de ainda não está acabado mas já está habitado.
É uma construção nova que está a crescer, e depois vamos abandonar isto que já
está em ruína.”
Aerograma – “História, contos,
histórias pessoais, secretas.”
Van Dyck Brown – “O Van Dyck Brown é
bom. É um processo fotográfico antigo para materiais antigos, fórmulas antigas
que já não se vendem mas feitas por mim. Ir à farmácia comprar os químicos e
fazer a química antiga.”
Hasselblad – “O Roll’s Royce das
máquinas fotográficas.”
Paolo Conte – “Adoro, sou um amante de
Jazz… é um grande músico italiano”
Buraka Som Sistema – “É uma música
alternativa e diferente, gosto da ideia porque é completamente diferente. É um
mix angolano português.”
Colonial – “Passado.”
Chá ou café – “Café.
Bica. Em angola café ginga”
Mota ou bicicleta – “Bina.”
Sagres ou cuca - “Isso agora é que me
f#! Gosto das duas, mas a Cuca faz-me mal, não sei é de estar lá, se é do
gargalo… mas bebo menos… sagres… as duas, gosto das duas.”
Lisboa ou Berlim – “Complicado, tenho
muito respeito por Lisboa mas adoro Berlim. Não quero deixar Lisboa mal,
recebeu-me bem, não é madrasta nem é mãe, mas é quase uma mãe em segundo grau.
Lisboa? Berlim? Berlim.
Luanda ou Huambo – “Luanda, não conheço
o Huambo. Não conheço nada do resto de Angola, na altura era muito difícil e
agora com trabalho também complica sair de Luanda. Mas este ano, se for lá vou
para Benguela e para Malanje.”
Pergunta para o
próximo artista a entrevistar:
“Como é que vês as ex-colónias?”
Observação:
A
entrevista foi realizada na esplanada da Cantina Lx com som de aviões, clientes
habituais e até uma outra entrevista a um realizador conhecido, na mesa ao
lado.
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